O papel da polícia: entenda o que é a desmilitarização da polícia
O papel da polícia: entenda o que é a
desmilitarização da polícia
Duas PECs tramitam no Congresso
Nacional com o intuito de desmilitarizar a Polícia Militar e unificá-la à
Polícia Civil. Policiais negam que formação militar contribua para atitudes
policiais violentas (Fernando Frazão/ABr)
Mais de 600 mortos em maio de 2006 em uma
série de ataques na Baixada Santista, 111 presos assassinados em 1992 durante o Massacre do Carandiru, o
desaparecimento do pedreiro carioca Amarildo de Souza em 14 de julho deste ano
e a violência policial contra professores na Câmara dos Vereadores do Rio.
Esse histórico trouxe novos
questionamentos sobre o papel da Polícia Militar.. Assim, com as manifestações
que ganharam as ruas do país desde junho e os episódios de violência na atuação
da Polícia Militar registrados em algumas ocasiões, a desmilitarização das
polícias estaduais voltou a ganhar espaço no debate público. Em maio de 2012, a
Dinamarca chegou a recomendar, na reunião do Conselho de Direitos Humanos da
Organização das Nações Unidas (ONU), que o Brasil extinguisse a Polícia
Militar. A ideia, no entanto, foi negada nacionalmente por ferir a Constituição
Federal de 1988 e a dúvida permaneceu sobre o que de fato significaria uma proposta
pela desmilitarização.
A divisão entre polícia Civil e Militar
sempre existiu no Brasil. A atribuição de cada grupo está explícita no artigo
144 da Constituição Federal de 1988. Às polícias civis, dirigidas por delegados
de polícia de carreira, cabem as funções de polícia judiciária e a apuração de
infrações penais, exceto as militares. Já às polícias militares cabem o
policiamento ostensivo e a preservação da ordem pública. “Antes da ditadura
militar, existiam polícias Militar e Civil, mas a Civil também desempenhava
papel ostensivo. Foi com a ditadura que as atribuições da Polícia Civil foram
se esvaziando e a Militar tomou para si toda a parte ostensiva”, destaca o
professor de direito penal Túlio Vianna, da Universidade Federal de Minas
Gerais (UFMG).
A proposta de desmilitarização consiste na mudança da Constituição, por meio de Emenda Constitucional, de forma que polícias Militar e Civil constituam um único grupo policial, e que todo ele tenha uma formação civil. “Essa divisão atual é péssima para o país do ponto de vista operacional, pois gasta-se em dobro, e é ruim para o policial, que precisa optar por uma das carreiras”, explica Vianna.
Uma das críticas feitas à militarização da polícia é o treinamento a que se submetem os policiais militares. “As forças armadas são treinadas para combater o inimigo externo, para matar inimigos. Treinar a polícia assim é inadequado, pois o policial deve respeitar direitos, bem como deve ser julgado como um cidadão comum e não por uma Justiça Militar”, argumenta o professor da UFMG. “Grande parte dos policiais militares que são praças também defendem essa ideia da desmilitarização já que eles são impedidos de acessar garantias trabalhistas, além de terem direitos humanos desrespeitados”, afirma Vianna.
Para o coronel reformado da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) e ex-secretário de segurança do DF, Jair Tedeschi, entre os militares, a posição é outra: a ideia de desmilitarização policial é uma “falácia”, defende. “O que querem é quebrar a disciplina e a hierarquia que existe em qualquer organização. Não é porque a polícia é militar que age puramente como militar. A função dela é civil. As suas bases de disciplina e hierarquia que são militares". O coronel avalia ainda que "o policial militar de hoje sabe distinguir quem tem direitos e deveres. Na rua, é obrigado a tomar decisões”, observa.
A formação atual do policial, segundo o coronel Tedeschi, abrange o conceito de humanização. “Hoje a polícia é completamente diferente, isso foi na década de 1960. As academias ensinam segurança pública. Desde 1988 a polícia vem mudando a sua maneira de agir. Ela está na rua, não nos quarteis. Ela interage com a sociedade, não cumpre a lei porque tem que simplesmente cumpri-la, mas age da forma mais democrática possível”, avalia o coronel Tedeschi. Para o coronel, "desvios de comportamento ocorrem em condições isoladas em vários grupos. Na situação atual não vemos isso só na Polícia Militar, mas também na Polícia Civil e em outros segmentos não militares", aponta.
Atualmente, dois projetos de Emenda à Constituição (PEC) circulam no Congresso Nacional em defesa da desmilitarização da polícia. A PEC 102, de 2011, de autoria do senador Blairo Maggi (PR/MT), autoriza os estados a desmilitarizarem a PM e unificarem suas polícias.” Ela não faz especificamente a unificação e a desmilitarização, mas autoriza que cada estado federado possa fazê-lo caso julgue necessário”, explica Vianna. A PEC está em tramitação no Senado.
Já a PEC 430, de 2009, em tramitação na Câmara dos Deputados, visa a unificação das polícias Civil e Militar dos Estados e do Distrito Federal, além da desmilitarização do Corpo de Bombeiros, bem como dá outras funções para as guardas municipais. A proposta é de autoria do deputado federal Celso Russomanno (PP-SP).
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